sábado, 12 de dezembro de 2009

Cinema e História

Cinema e História

O cinema exerce a função de agente da história e sua ação sócio-política pode possuir até mais poder que as instituições que o utilizam como meio de propagação de ideologias. Os nazistas utilizaram amplamente o cinema. Toda produção cinematográfica era controlada, do roteiro até a música. Para garantir a difusão espalharam 70.000 projetores de filmes por escolas e universidades, aumentaram o número de sessões – algumas gratuitas. Na União Soviética, havia total percepção do poder do cinema, porém não existiu o controle absoluto da produção apenas da mensagem explícita da obra. Alguns cineastas soviéticos mesmo a favor do regime conseguiram realizar filmes que fugiam da ideologia vigente. Nos países democráticos, o cinema também foi usado como propaganda de Estado e com uma política orientada pra isso. Durante a II Guerra, os Estados Unidos montaram um programa de distribuição de filmes que justificassem a entrada na guerra e a aliança com os soviéticos. Paralelamente os próprios estúdios já produziam filmes que exaltavam a cultura nacional. Não devemos somente entender o filme na forma de documentário ou ficção, também existe a modalidade do cinema publicidade que tem ação mais direta e de grande desempenho.
Parte da função do cinema foi alterada pela TV, podendo ser entendida como multiplicação da atividade do cinema por transmitir filmes ou limitadora, devido a produção própria. Os dois meios não convergem necessariamente, na URSS a TV seguia o discurso estatal, diferente do cinema. O cineasta russo Andrei Tarkovski é um dos exemplos da fuga da ideologia oficial, pois expressou em seus filmes sua visão de mundo, se distanciando da imposta pelo o governo soviético. Nestes casos onde a opinião do autor sobressai a qualquer imposição, ocorre uma quebra no monopólio do discurso sobre a sociedade, a obra, no caso o filme, entra para o cenário político. Como outros exemplos da influência do cinema na vivência política, Marc Ferro também destaca os cineastas René Clair e Jean-Luc Godard que impactaram a juventude de maio de 1968 com os filmes da Nouvelle Vague, sendo um movimento artístico do cinema que contestava os anos 60, a política e a cultura impostas pelas potências que lideravam os blocos em conflito na Guerra Fria.
O historiador, em sua análise do documento fílmico, deve se interessar pelas formas específicas da ação do cinema. O que M. Ferro quer dizer está relacionado não com as “formas específicas” do romance ou as do discurso político, mas sim as concernentes à própria linguagem cinematográfica (efeitos zoom, utilização da montagem paralela, uso do espaço fora-da-tela num contexto inesperado etc.) e às suas inovações, que podem interferir nas próprias condições de recepção do filme. Nesse sentido, sabendo que a arte cinematográfica trabalha com a forma para mexer com a imaginação do espectador, o filme fica à mercê do próprio público, de sua cultura, podendo causar impacto, ou não – obras como a de Charles Chaplin, por exemplo, sobrevivem ao tempo e são capazes de gerar boas reflexões, enquanto outros filmes não são relevados, o que não aponta para sua descartabilidade - apenas comprova sua condição frente ao aspecto cultural, podendo posteriormente ganhar certa atenção. Sendo assim, nos EUA, a produção dos filmes teve que considerar a alteridade em relação aos espectadores que iam ao cinema, buscando não chocar a sensibilidade nem dos judeus, nem dos negros, nem dos irlandeses, agradando a um grande número de pessoas. Ferro diz também que um dos aspectos da relação cinema-história menos estudados é a história da própria produção cinematográfica, marcada por rivalidades entre os vários setores de produção envolvidos num projeto, que são ocultadas às vezes pela publicidade e até mesmo pela crítica –esses conflitos de poder se estendem à concorrência frente à TV e seus telefilmes.
Marc Ferro aponta para dois tipos de abordagem: o filme como documento do presente e o filme como representação do passado. No primeiro caso, o filme é entendido assim por fornecer informações (diretas ou indiretas) sobre a sociedade contemporânea a sua produção. Essas informações são passadas independentemente da intenção do filme, ou seja, sendo um documentário ou noticiário, cuja função é justamente informar ou em uma obra de ficção, que não tem necessariamente essa função. É evidente que existem escolas de cineastas que pretendem revelar, sob forma de divertimento, o funcionamento social e político de seu tempo. Por exemplo: Fritz Lang, Renoir, Victorio de Sica. Já no segundo caso, o filme é entendido como uma fonte, uma “bibliografia”. Sendo assim, se questionado poderia revelar elementos do passado.

Palavras-chave: ideologia, propaganda, arquivo, documento, filme, política.

FERRO, Marc. Cinema e História. IN: Dicionário das Ciências Históricas. BURGUIERE, André (Org.). Rio de Janeiro: Imago, 1993.

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